quarta-feira, novembro 04, 2015

Gabriela Ruivo Trindade pede mais atenção da parte dos media

Era este o título de um dos links que se podiam encontrar na homepage do Diário Digital, e que davam acesso à minha entrevista publicada nessa mesma plataforma de informação online, na segunda-feira passada.

Se fosse um trabalho escolar, feito numa aula do sétimo ano, do tipo: lê esta entrevista e depois dá-lhe um título que tente abranger os seus pontos essenciais, que nota acham que o professor daria a um título destes? Na minha opinião, insuficiente.

Insuficiente, porque não representa de forma integral aquilo que eu disse; é aliás, uma representação não só parcial como extremamente adulterada das minhas palavras. Eu dou ênfase a uma questão global, que é a da pouca atenção que os media prestam às mulheres escritoras, e este título, por oposição, personaliza as minhas afirmações. Transforma uma questão geral e pertinente num assunto pessoal, de ego; uma questão da maior importância, quanto a mim, não só no panorama literário mundial (Portugal é apenas uma gota no oceano), como em todos os panoramas possíveis, porque como sabemos a discriminação sexual não se fica pelo meio literário. E quando uma mulher põe o dedo na ferida, e fala disto abertamente, é apontada como alguém que pede atenção para si própria. Uma coisa pessoal, egocêntrica, infantil quase: a mulherzinha a pedinchar a atenção dos media. 

Tenho perfeita consciência do privilégio, em termos de atenção mediática, que representa ganhar o Prémio Leya. A questão não passa por aí. E mais: não me faz impressão nenhuma o destaque àqueles autores que estão sistematicamente no foco da imprensa. A maioria são autores da minha eleição. Acho que merecem todos os gramas de atenção de que são alvo, e se calhar mais ainda. Essa atenção tem é que ser multiplicada. Por tantos nomes de que praticamente não se ouve falar, a maioria femininos. E se me incluo no pacote, é porque acho que o meu caso é ilustrativo da forma como as mulheres autoras são tratadas. Tenho a certeza absoluta de que qualquer outro prémio Leya que fosse distinguido com um segundo galardão (estou quase certa de que nunca aconteceu, mas se estiver errada alguém me corrija) já teria, por esta altura, suscitado o interesse da imprensa, de forma muito mais evidente do que aconteceu, até agora, com Uma Outra Voz. E não, não acho que, por já ter tido a atenção devida quando saiu o prémio, deva ficar caladinha e agradecer a dádiva generosa que Deus, ou o destino, me concedeu. Em primeiro lugar porque não foi uma dádiva: o prémio foi ganho com o meu trabalho, suor, esforço e talento. Em segundo lugar, porque acho que tenho todo o direito ao mesmo tratamento que os meus colegas de prémio. A sociedade e os media não estão preparados para uma atitude assertiva e reivindicativa como esta, por parte de uma mulher? Temos pena.

Eu não quero a atenção dos media; quero, isso sim, que estes façam um trabalho sério, isento, imparcial, anti-discriminatório. É pedir muito? Se não é lei, deveria. 

(Como é óbvio, nada disto tem a ver com o conteúdo da entrevista, nem com a forma como foi conduzida, que foi excelente).



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